A coparticipação, presente em muitos planos de saúde, é um mecanismo que permite ao beneficiário dividir os custos de consultas e procedimentos com a operadora. Essa modalidade é vista como uma forma de tornar as mensalidades mais acessíveis, incentivando o uso consciente dos serviços de saúde. No entanto, a falta de uma regulamentação clara por parte da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) sobre os limites dessa cobrança tem gerado debates e decisões judiciais importantes.

Em outubro de 2023, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o Recurso Especial nº 2.001.108, reafirmou a validade da cobrança de coparticipação, mesmo para procedimentos não listados no Rol da ANS. A decisão, contudo, estabeleceu três requisitos essenciais para que essa cobrança seja considerada legítima: primeiro, a previsão expressa no contrato do plano de saúde; segundo, que a cobrança não seja abusiva, ou seja, não financie integralmente o procedimento ou restrinja severamente o acesso do beneficiário aos serviços de saúde; e terceiro, que respeite o limite máximo de 50% do valor contratado entre a operadora e o prestador de serviço. Essa posição do STJ não é novidade, pois está alinhada com decisões anteriores, reforçando que a coparticipação, por si só, não é ilegal, desde que respeite as regras aplicáveis.

Embora a Lei nº 9.656/1998 e a Resolução do Conselho de Saúde Suplementar nº 08/1998 já prevejam a necessidade de clareza nos contratos sobre os limites da coparticipação e proíbam sua cobrança percentual para a maioria das internações, a grande questão é a ausência de um teto legal ou regulatório para a cobrança. No passado, a Resolução Normativa nº 433/2018 da ANS limitava a coparticipação a 40% do valor do serviço. Contudo, após o Supremo Tribunal Federal (STF) questionar a competência da ANS para tal regulamentação, a própria agência revogou a norma, deixando um vácuo regulatório que ainda não foi preenchido.

A ausência de uma norma específica que estabeleça limites claros de coparticipação abre espaço para práticas questionáveis por parte de algumas operadoras. Casos de cobrança sem previsão contratual, ou de aplicação de coparticipação para tratamentos de alto custo como quimioterapia, não são raros. Mesmo com o teto de 50% estabelecido pelo STJ, a falta de uma fiscalização robusta permite que algumas operadoras desrespeitem o limite, transferindo o custo integral de tratamentos complexos para o consumidor. Isso contraria a própria natureza da coparticipação, que deveria ser um instrumento para equilibrar as contas, e não para negar acesso ou inviabilizar o tratamento. A coparticipação é um mecanismo financeiro válido e importante para equilibrar o mercado de saúde suplementar, tornando os planos mais acessíveis e coibindo o uso desnecessário de serviços. No entanto, é fundamental que haja uma regulamentação mais clara e uma fiscalização eficaz para evitar que esse mecanismo se torne uma barreira de acesso à saúde. O debate sobre a coparticipação exige um olhar cuidadoso para que o objetivo de racionalizar o uso dos serviços não se perca e acabe resultando em um obstáculo financeiro intransponível para quem mais precisa de assistência.

Sócia Gestora


E-mail: hannah@alvesoliveira.adv.br