
Uma breve olhada nas redes sociais, feeds de notícias ou notificações cotidianas frequentemente revela datas comemorativas ligadas ao universo animal. Ainda que muitas dessas datas passem despercebidas, elas representam um movimento crescente de conscientização sobre o papel dos animais em nosso cotidiano e, especialmente, sobre os direitos que lhes são reconhecidos juridicamente.
Esse movimento reflete uma transformação silenciosa, porém estruturante, no ordenamento jurídico brasileiro, o reconhecimento dos animais como sujeitos de tutela diferenciada. Diante disso, surge uma reflexão necessária para empresários do setor: qual é a responsabilidade legal de clínicas, hospitais veterinários, pet shops e demais estabelecimentos comerciais que atuam diretamente com o bem-estar animal?
O Direito brasileiro passou por uma inflexão paradigmática nas últimas décadas. Os animais, antes tratados meramente como “coisas”, passaram a ser reconhecidos como seres sencientes, ou seja, capazes de sentir dor, medo, prazer e afeto. Essa mudança foi sacramentada com o julgamento do REsp 1.713.167/SP, no qual o STJ reconheceu que os animais não podem mais ser tratados como meros bens patrimoniais.
A esse reconhecimento soma-se a vigência da Lei Federal nº 14.064/20, que aumentou significativamente a pena por maus-tratos, além de diversas propostas legislativas em curso que visam reformar o ordenamento jurídico civil e penal para reforçar o status jurídico dos animais como seres sencientes. Trata-se de uma tendência clara de fortalecimento da tutela jurídica dos animais no Brasil.
No setor empresarial voltado à saúde e bem-estar animal, o cumprimento de normas sanitárias, consumeristas e ambientais é obrigação legal e estratégia de mitigação de risco.
Veterinários e os Hospitais, por exemplo, devem observar o Código de Ética Profissional e podem ser responsabilizados civil e penalmente por condutas lesivas aos animais sob seus cuidados.
Pet shops e estabelecimentos que comercializam animais devem respeitar não só o bem-estar do animal, mas também as normativas do CONAMA, do MAPA e dos órgãos estaduais. O bem-estar animal é elemento jurídico do contrato de consumo e pode gerar responsabilidade objetiva por danos causados aos clientes ou aos animais, inclusive na esfera moral.
Empresas do ramo veterinário, hospitais e pet shop não operam à margem dessas transformações. Ao contrário, estão no epicentro de um mercado que, embora economicamente promissor, exige responsabilidade jurídica qualificada.
É imprescindível que tais empresas estejam juridicamente orientadas de forma preventiva, com assessoria especializada e protocolos de compliance animal. Isso inclui: I) Adoção de práticas de bem-estar animal; II) Documentação legal e técnica das atividades; III) Contratos claros com cláusulas de responsabilidade; IV) Treinamento de funcionários quanto ao manejo correto dos animais; V) Estruturação de defesa jurídica em casos de fiscalização ou judicialização.
Além disso, é crescente a jurisprudência que reconhece a responsabilidade civil por falhas no tratamento de animais, danos morais decorrentes de mortes, negligência em serviços, venda de animais doentes ou com vícios ocultos, entre outras hipóteses.
Outro aspecto essencial é a conformidade com as normas sanitárias e ambientais. A atuação de clínicas e estabelecimentos pet deve respeitar integralmente as exigências da Vigilância Sanitária Municipal e Estadual, sob pena de interdição, autuação e aplicação de penalidades administrativas.
Empresas que atuam com animais devem compreender que o Direito dos Animais é vetor de compliance. A implementação de boas práticas, como o desenvolvimento de manuais internos de bem-estar animal, capacitação de colaboradores e auditorias periódicas, torna-se não apenas uma exigência ética, mas também uma vantagem competitiva e jurídica.
Que sirva de alerta e oportunidade: os animais, todos eles, silvestres, exóticos, domésticos ou não, têm proteção jurídica e sua existência não deve ser romantizada nem mercantilizada de forma irresponsável. Ao contrário, é imperativo que empresários, veterinários, criadores e profissionais do setor compreendam que respeitar os direitos dos animais é, também, respeitar os limites da própria legalidade empresarial.
O Direito avança também sobre a proteção animal, e as empresas do setor pet devem acompanhar essa evolução com responsabilidade e atualização constante, sempre com o apoio de advogados especializados para garantir conformidade legal e prevenir riscos.
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